Propensa ao "sim", Irlanda vota tratado que pode marcar nova era da União Europeia

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Os irlandeses voltam às urnas nesta sexta-feira (2) para votar o destino do Tratado de Lisboa, que conserva em grande parte o projeto de Constituição europeia rejeitado por vários países antes de ser redesenhado em 2007. É a segunda tentativa de aprová-lo na ilha e desta vez as pesquisas de intenção de voto apontam vitória do "sim". Além dos irlandeses, tchecos e poloneses ainda não ratificaram o acordo.

Caso o tratado seja aprovado, os direitos de veto dos países-membros serão limitados, um gabinete da Presidência da União Europeia seria criado e a posição do chefe de política externa do bloco seria fortalecida. Os direitos de voto dos países-membros seriam ajustados para que reflitam seu tamanho e o Parlamento Europeu teria mais poderes. Na Irlanda, pesquisas recentes mostram 48% a favor do "sim", 33% pelo "não" e 19% de indecisos.

O problema é que os europeus, em especial os irlandeses, parecem cansados de votações europeias. Vários referendos foram derrotados nos últimos anos, dizem especialistas de todo o mundo, por conta de questões que pouco ou nada têm a ver com eles, como imigração - o temor de aprovar a Constituição Europeia para muitos era atrair gente de todo o mundo para mendigar nas ruas de Paris ou de Amsterdã.

Por conta da exigência de que os 27 membros da UE aprovem as medidas, é impossível questionar a legitimidade das decisões, sejam elas tomadas pelo Poder Legislativo ou em referendo - o último caso costuma antecipar agendas eleitorais e seus resultados são mais temidos pelos governantes. A questão na Irlanda é a economia: aprovar o tratado reduzirá impostos? Embora os governistas digam que o temor não faz sentido, é assim que seus adversários - o Sinn Féin, antigo braço político do Exército Republicano Irlandês (IRA), e o Partido Socialista - estão fazendo sua campanha pela nova rejeição.

Pressão pelo "sim"

A Irlanda é um dos países mais afetados pela crise econômica na Europa e o governo liderado pelo partido centrista Fianna Fáil é um dos mais impopulares da história da ilha. Mesmo assim, a tese da sua administração segue na frente nas pesquisas de intenção de voto.

"Só com um sim nós vamos garantir a confiança do investidor na Irlanda, proteger nossa influência em decisões econômicas vitais e reformar a Europa de forma que ela seja mais dinâmica e eficiente", disse o primeiro-ministro Brian Cowen em um comício pela aprovação do tratado na quarta-feira.

Não está sozinho. Uma coalizão de 54 grupos empresariais, incluindo grupos do setor bancário e de comércio, alertou que uma nova rejeição do Tratado de Lisboa deixaria "um grande ponto de interrogação sobre o relacionamento da Irlanda com a UE e minaria nossa habilidade como economia pequena e aberta de competir nos mercados europeu e global". Os argumentos até agora mostraram ter efeito sobre a população, embora na rejeição feita em 2008 a atual crise econômica não tivesse explodido.

Além da pressão interna, maior desde que o primeiro-ministro afirmou ser impossível uma terceira tentativa de aprovar o tratado, líderes de outros países da UE estão colocando a Irlanda contra a parede, alegando que o país corre risco de fragilizar sua posição no clube europeu. Mas admitem reservadamente à imprensa do Velho Continente que não haveria muito a fazer se os irlandeses voltarem a dizer não. O resultado das urnas deve sair no sábado.

Rejeição
Em 1992, a Dinamarca rejeitou o tratado de Maastricht, que dá à UE caráter não apenas econômico, mas também político. Os irlandeses recusaram o acordo que derivou deste, o de Nice, em 2001. França e Holanda repeliram a Constituição Europeia em 2005. O Tratado de Lisboa, que mantém os principais itens da Carta Magna do Velho Continente, foi rejeitado pela Irlanda pela primeira vez no ano passado. A expectativa inicial era de que ele entrasse em vigor em 1º de janeiro de 2009.

Na rejeição do Tratado de Lisboa no ano passado, ainda não havia crise econômica nem recessão global. Neste ano, o PIB irlandês deve cair 9%, o desemprego disparou e a expectativa é de que chegue a 16% das pessoas economicamente ativas do país. Em entrevista à Rádio Europa Livre, divulgada em jornais irlandeses, o analista-sênior do Centro de Política Europeia em Bruxelas, Janis Emmanouilidis, afirmou que "os irlandeses estão mais sensíveis desta vez do que no ano passado aos riscos de não aprovarem o tratado".

Mas ainda que a Irlanda aprove o documento, afirma ele, o problema não estará inteiramente resolvido. "A missão não estará cumprida por causa do problema da República Tcheca, já que o presidente deles está relutante em lidar com o assunto. A questão da Polônia ainda está aberta, embora o presidente polonês tenha dito que assinará o tratado depois de os irlandeses dizerem sim", disse ele, referindo-se aos dois países que ainda faltariam para aprovar o Tratado de Lisboa em caso de "sim" da Irlanda na sexta-feira.

Além das dúvidas do presidente tcheco, Vaclav Klaus, senadores do país estão levando o tratado à suprema corte do país repetidas vezes para atrasar o processo. "Isso pode trazer tantos problemas que a oposição do Partido Conservador britânico pode usar isso se chegar ao poder, colocando o Tratado de Lisboa também em referendo no Reino Unido. O prazo é maio de 2010", afirma o analista. Com a inclinação do eleitorado em favor dos adversários do premiê trabalhista Gordon Brown, a aprovação da Irlanda pode ter vindo tarde demais.
Fonte:UOL

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